Imagine a seguinte situação: O empregado Coronado, que só tem 10 meses na empresa, tem pessoas do grupo de risco na família e está com receio de ir trabalhar. O Coronado então vai até o dono da empresa e diz assim:
Ô, chefinho! A situação tá complicada e eu queria tirar as minhas férias, tem como?
O dono da empresa vai lá na sala do Departamento Pessoal e pergunta pro empregado, que é responsável pelo DP, se pode. O empregado responde pro chefe:
Normalmente não pode, mas na situação atual, se tiver um acordo escrito, pode sim!
O dono da empresa pede o acordo, o empregado Coronado assina e fica feliz porque vai poder ficar em casa. Tudo certo para todos!
E por que ele pode fazer isso?
A MP 927/2020 trouxe a possibilidade de acordos individuais entre empregados e empregadores, com a finalidade de ajudar a manter os empregos nesse momento de pandemia do COVID-19. Mas como isso funciona?
Durante o estado de calamidade pública, os acordos individuais têm preponderância sobre os demais instrumentos normativos, legais e negociais, desde que seja respeitado os limites da Constituição.
No exemplo da histórinha do Coronado, a CLT não permite gerar férias individuais de forma antecipada, mas a Constituição não tem essa restrição, então é possível!
E onde sabemos o que a Constituição não permite?
No art. 7º! Lá tem os direitos fundamentais dos trabalhadores urbanos e rurais. Vamos ver alguns exemplos?
A empresa quer demitir o empregado e fazer acordo para não pagar a multa de 40% do FGTS, pode?
Não! A MP 927 só pode ser utilizada para preservar o emprego e a renda e garantir a permanência do vínculo empregatício! Além disso, o inciso I do art. 7º da CF que em caso de dispensa arbitrária, sem justa causa, cabe indenização. Ou seja, não pode fazer acordo abrindo mão da multa do FGTS.
E se o empregado que trabalha em ambiente periculoso falar que aceita não receber periculosidade nesse período, pode fazer acordo?
Não! Está lá no inciso XXIII que as atividades penosas, insalubres ou periculosas devem ter adicional na remuneração!
Viram só? Esses dois exemplos mostram que, apesar da MP 927 ter flexibilizado a negociação individual, existem limites para isso.
Veja outros pontos que a Constituição trata:
remuneração do trabalho noturno superior à do diurno;
salário-família;
aviso prévio proporcional ao tempo de serviço;
remuneração das horas extras de, no mínimo 50%.
Ou seja, amigos, é preciso muita cautela na hora de fazer acordos individuais com os empregados, pois o trabalhador é a parte mais frágil da relação e diversos pontos da relação trabalhista é voltado para a proteção dele.
E tem mais!
Em 31/03, o Ministério Público do Trabalho publicou uma Nota Técnica sobre a MP 927/2020, esclarecendo alguns pontos, como medidas provisórias não poder autorizar a supressão de convenção e acordo coletivo mediante acordo individual.
E o que isso significa? A Nota Técnica é uma análise da norma pelo órgão e, apesar de não ter poder de lei, serve como esclarecimento. Na prática, a MP 927 continua vigente, mas pode ter seu texto alterado pelo Congresso, em respeito ao que diz o MPT.
O que orientamos para vocês nesse momento é que, ao fazer acordos com os empregados, verifiquem a Constituição Federal, mas também verifiquem as convenções coletivas, para não desrespeitá-las, uma vez que essa é a orientação do MPT.
Esse é um momento pode causar uma insegurança jurídica, por isso todas as decisões devem bem planejadas, de maneira que ajude a manter o emprego e a renda dos trabalhadores, sem prejudicar nem a empresa e nem o trabalhador. Uma tarefa árdua para quem é da área trabalhista, mas que vamos superar juntos!
Trabalhista/Previdenciário
Fonte: Tributanet