Períodos de crise costumam ser promissores para o mercado de franquias. Executivos que perdem empregos costumam recorrer ao setor como alternativa de ter o negócio próprio, por não precisar lidar com as dificuldades de uma empresa de marca própria em estágios iniciais. Tal movimento alçou as microfranquias (com investimento inicial de até R$ 90 mil) ao top 10 de maiores redes do Brasil, de acordo com ranking divulgado pela Associação Brasileira de Franchising (ABF).
A crise do coronavírus, no entanto, é diferente: há desempregados, mas as redes, em sua maioria, estão impedidas de atuar da forma que foram formatadas por conta da quarentena. Muitas já vislumbram que sairão transformadas desse período, com poucas referências do que eram antes. Com um cenário tão incerto, é hora de investir em franquias, continuar negociações iniciadas antes da paralisia ou guardar o dinheiro e esperar?
Se o empreendedor ainda não tinha contato com o sistema de franquias nem iniciado uma negociação, o ideal é que avalie as oportunidades, com cautela, sem investimento por impulso. O consultor do Sebrae-SP Ruy Barros diz que a opção mais fácil é aguardar a crise passar para tomar decisões de investimento, exceto se o negócio tiver oportunidades imediatas, como tecnologia, telecomunicações, videoconferência ou aluguel de notebooks. "Mas analise os números, veja o valor do investimento, as taxas que a franquia está cobrando, o prazo de retorno estimado e em quanto tempo conseguirá atingir um ponto de equilíbrio", orienta.
Ele comenta que, se esse já era um plano do empreendedor, que considere algumas novas questões trazidas pelo cenário atual. "A crise mudou muitos negócios, mas abriu as portas para vários outros. Por exemplo, investir em franquias que usam as redes sociais pode ser uma oportunidade, pois nunca tivemos tantas pessoas conectadas e com tempo livre devido à falta de deslocamento e com potencial para adquirir seu produto ou serviço. Franquias de renegociação de dívidas, de avaliação de contratos, de contabilidade, podem ser opções também", afirma.
"Ninguém vai retomar de onde parou"
De acordo com a advogada especializada em franchising Andrea Oricchio, o mercado vai voltar, em algum momento, mas dentro de um novo cenário. "Aqueles números, simulações e premissas discutidos antes da pandemia não serão mais como previstos. É preciso começar a uma avaliação dentro da realidade atual. Ninguém vai retomar do patamar em que parou, é um recomeço", afirma.
A franqueadora deve ter ainda mais cautela ao oferecer e comercializar franquias nesse momento. A captação de franqueados apenas para gerar caixa imediato é uma ação que pode trazer grandes implicações futuras para as duas pontas. "Essa prática já vem sendo criticada pelo oportunismo da situação. O franqueador sério, que se vê em um evento pós-pandemia, deve ter um cuidado ainda maior com a marca e a rede. O elo e a confiança que ele inspira se tornam ainda mais fundamentais na retomada", diz Andrea.
A especialista lembra que a nova lei de franquias já está em vigor e o candidato pode e deve exigir ainda mais transparência do franqueador durante o processo de negociação. "Algumas medidas que a franqueadora tomou durante a crise podem se perpetuar e isso precisa ser detalhado, pois pode não estar em documentos e manuais feitos antes da pandemia. Tem que ter muita transparência com quem está entrando para saber como vai lidar agora."
Ela recomenda que o período de baixa atividade dos negócios seja aproveitado para reforçar treinamentos, tanto com os franqueados antigos como os novos, e também suas equipes.
Cuidado com repasses de franquias
Alguns franqueados que já operam unidades atualmente podem desistir do negócio durante a pandemia e optar por vender para um novo empreendedor. A transação pode ser uma oportunidade de investir em um negócio já maduro, na visão de Andrea, mas requer cuidados. "Nesse tempo em que todos os valores estão sendo renegociados, é preciso entender quais foram os acordos feitos pelo franqueado com shopping centers, funcionários, fornecedores ou com a própria franqueadora. O novo empreendedor pode assumir, junto com o negócio, dívidas que foram suspensas nesse período, mas que vão ser cobradas no futuro."
Compre agora e pague no futuro?
O parcelamento da taxa de franquia já vinha sendo feito há alguns anos, decorrente da crise econômica, e também pode ser praticado agora. A especialista também não vê problemas no adiamento do pagamento inicial, desde que o franqueador continue respeitando os próprios critérios que garantem o sucesso prometido do negócio.
"Não adianta trazer gente sem perfil de franqueado, porque a empresa não vai parar de pé. Não vai ser culpa da pandemia, será da franqueadora, que sabia disso e colocou para dentro alguém sem a devida capacidade operacional ou financeira. O perfil delimitado na formatação tem que ser seguido à risca. Se faz parte do negócio ter capital de giro por três meses, por exemplo, isso continua valendo", afirma.
Para o candidato a franquado, o cenário também pode ser uma oportunidade para negociar melhores condições com a franqueadora, de acordo com o consultor do Sebrae-SP. "Uma redução na taxa de franquia, desconto no enxoval, início antecipado dos treinamentos. Negociar nunca foi tão importante como agora, mas tem quer ser ganha-ganha, pois todos estão no mesmo barco."
Fonte: Pequenas Empresas Grandes Negócios